Negociar a venda de uma empresa vai muito além do preço
- Giovanni Rozan
- 21 de set.
- 3 min de leitura

Quando se fala em fusões e aquisições (M&A), a maioria das manchetes destaca apenas o valor da operação. Porém, quem vive esse processo sabe: o que realmente define o resultado líquido para o empresário não é o preço anunciado, mas sim as cláusulas do contrato e os termos da negociação. A seguir, além de explicar os principais mecanismos contratuais, trago exemplos práticos de como cada um deles pode transformar um deal milionário em um bom ou em um péssimo negócio.
Exemplos de Cláusulas de Acordo de Acionistas
Direito de preferência
Imagine um grupo de sócios em uma indústria alimentícia. Um deles quis vender sua participação para um investidor estrangeiro. Graças à cláusula de preferência, os sócios que já estavam no negócio puderam comprar essa fatia antes, evitando perder o controle estratégico da operação. Sem essa cláusula, poderiam ter ganho um “sócio indesejado” que mudaria os rumos da companhia.
Tag Along
Em uma empresa de tecnologia que vendeu o controle a um fundo internacional, os minoritários conseguiram vender suas ações pelo mesmo preço pago ao controlador. Esse “tag along de 100%” foi crucial para garantir liquidez e justiça. Em casos onde o tag along não existe, minoritários podem ficar presos em uma empresa controlada por um novo dono, sem liquidez e sem voz.
Drag Along
Um fundo de venture capital recebeu proposta de compra de 100% de uma startup de logística. Alguns minoritários não queriam vender, mas a cláusula de drag along obrigou todos a seguir a decisão. O resultado: liquidez para todos os acionistas, ainda que alguns preferissem permanecer. Isso é comum em operações de saída de fundos.
Política de dividendos
Já houve situações em que investidores institucionais exigiram um percentual mínimo de dividendos para garantir retorno, enquanto fundadores queriam reinvestir tudo em crescimento. A ausência de cláusula clara gerou conflito, atrasando a expansão da empresa. Quando essa política é bem definida desde o início, evita-se um desgaste enorme.
Termos de Negociação em M&A: onde o valor muda de verdade
Ajustes de preço
Um caso clássico: uma empresa industrial foi vendida por R$ 200 milhões. Porém, no fechamento, descobriu-se que o capital de giro estava abaixo do pactuado. Resultado: o comprador exigiu ajuste de R$ 20 milhões. O preço anunciado não refletiu o que o vendedor efetivamente recebeu.
Earn-out
Em uma rede de clínicas, parte do pagamento estava condicionada ao crescimento de receita em 2 anos. O problema: os critérios de cálculo não foram bem definidos. Surgiram divergências sobre quais receitas deveriam entrar na conta, gerando litígio entre vendedor e comprador. O aprendizado é claro: earn-out só funciona quando métricas estão extremamente bem detalhadas.
Garantias e indenizações
Em um deal do setor de alimentos, após a venda, o comprador descobriu um passivo trabalhista relevante. Como havia cláusula de garantia, parte do pagamento retido em escrow account foi usado para cobrir a contingência. Sem essa estrutura, o comprador teria arcado sozinho, ou teria entrado em disputa judicial contra o vendedor.
Escrow account
Em outro exemplo, 10% do valor da transação ficou retido em uma conta vinculada por 18 meses. Isso deu segurança ao comprador para avançar, mas também exigiu do vendedor paciência: parte de seu dinheiro só foi liberada após o período de carência.
Cláusula de não concorrência
Um empreendedor do setor de bebidas vendeu sua marca, mas abriu outra com produtos similares em menos de um ano. Como não havia cláusula de não concorrência robusta, o comprador viu parte do mercado ser rapidamente tomado pelo mesmo fundador. Desde então, esse tipo de cláusula passou a ser padrão em praticamente todas as operações.
O que esses exemplos nos ensinam
Essas situações mostram que o contrato é tão importante quanto o preço. Uma negociação de R$ 100 milhões pode render apenas R$ 70 milhões líquidos ao vendedor, se ele não se preparar para ajustes, retenções e contingências. O empresário que entende (ou se cerca de quem entende) de governança societária, due diligence e estruturação de contratos entra muito mais forte em uma mesa de negociação. Isso reduz riscos, aumenta previsibilidade e garante que o deal entregue valor real, e não apenas manchetes.
Negociar a venda de uma empresa não é apenas sobre “quanto vale”, mas sobre como, quando e em quais condições o valor será recebido. Cláusulas como tag along, drag along, earn-out, escrow e não concorrência podem mudar completamente o resultado. Por isso, empresários que pensam em captar recursos, trazer um fundo como sócio ou vender seu negócio precisam enxergar esses detalhes como parte essencial da estratégia. O preço é só o começo: o que fecha o negócio, de fato, é a qualidade do contrato.




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